
Há o 7 o 8 e o 9 que vão para os Aliados; há o 55 o 69 e outros mais que vão para o Bolhão e há muitos outros, que vão para outros tantos lados.
Há ainda o 227 que sai da Praça da Galiza e termina a carreira no Parque da Cidade, depois de passar pelo Castelo do Queijo, Arrábida, Afurada, Freixo, etc..
O 227 (parece número de autocarro mas não é) tinha acabado a sua corrida há poucos minutos. 4 horas e 18 minutos depois de ter partido da Praça da Galiza, junto ao Palácio de Cristal, ei-lo chegado ao Parque da Cidade. Triunfante mas nem tanto...
O 227 ainda esboçou uma tentativa para ir à zona das massagens, pouco concorrida naquele momento, mas achou que mesmo deitado ia ser difícil aturar alguém a mexer no seu corpo. Por isso lá se apressou a ir para o carro.
Lá chegado, abre a mala do carro e puxa de um powerwade e de uma barrita. Escasso de forças o 227 senta-se na mala do carro e fixa o horizonte. Do horizonte surge, então, pálida, magra e com aspecto doente uma senhora/rapariga que se-lhe dirige e lhe pergunta:
- Senhor, não tem um euro que me dê? É para eu comer qualquer coisita.
Maldisposto, o 227 responde:
- Não tenho moedas.
A rapariga afasta-se.
Pouco depois, nova incursão.
- Senhor, sabe se ali estão a dar bananas?
O 227, ainda em recuperação, olha e não responde.
- Ou será que só estão a dar aos atletas?
Já mais recuperado, o 227 chama a rapariga e diz-lhe:
- Tome lá um euro.
- Muito obrigada, responde a rapariga.
Alguns minutos depois:
- Os cafés estão todos fechados, não posso comprar nada, diz a rapariga.
O 227, ainda mais recuperado, vai ao saco e pega numa banana que tinha trazido de casa, e dá-a à rapariga:
- Tome lá, coma-a.
- Obrigada senhor.
- O senhor correu os 42 kms.? Eu nem caminhar posso, tenho que tomar oxigénio. E lá continuou a conversa durante mais alguns minutos.
Por momentos dois mendigos (um sem forças e outro sem comida e sabe-se lá mais o quê) sentiram-se iguais. Ao 227 pareceu-lhe que mais do que um euro e uma banana a rapariga tinha gostado da conversa e de sentir-se tratada com carinho. E o 227 também veio com o coração mais cheio.
Um grande abraço para este 227 que, mesmo esgotado de forças físicas e anímicas (por sua vontade) manteve os traços de humanidade que já lhe conhecemos e teve um gesto nobre para com a rapariga que lhe pedia ajuda(contra a sua vontade).
ResponderEliminarE brinda-nos com um conto daqueles que nos tocam fundo. Obrigado, Zé.
José,
ResponderEliminarA miséria pulula à nossa volta e sentimo-la crescer de tal forma que, muitas vezes, já parecemos vacinados, o que é tristeza. Às vezes as pessoas, para além das necessidades mais terrenas, precisam é de ser tratadas com humanidade.
abraço
MPaiva
nós queremos é justiça E DINHEIRO PARA O BIFE
ResponderEliminarSempre comovente estes relatos, mas mais uma vez se prova que no atletismo a fraternidade não é palavra riscada do dicionário, continua a ser o desporto onde a clubite não etá a cima dos valores humanos, (eu costumava dizer a brincar que no atletismo o melhor são os intervalos)mas que dizer desta estória em que o atleta ainda mal refeito do esforço tem um gesto simpático, crinhoso e consegue por momentos esquecer o seu problema e dar algum conforto a que mais precisa. Para estes dois atletas que não conheço um grande abraço.
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